[Filme aos domingos] Caché

11:35 Andrizy Bento 0 Comments


Para quem está habituado ao cinema de Michael Haneke, sabe que ele é fiel ao estilo que o consagrou. É um cineasta com uma identidade bem definida. Longos planos estáticos, cortes abruptos, câmeras subjetivas, ausência de trilha sonora, narrativa seca e crua são elementos recorrentes em suas obras. Em Caché, não é diferente. Todos estes itens corroboram a sensação de aflição que permeia o filme e acompanha personagens e espectadores durante toda a trama. E assim como em outros títulos que compõem sua filmografia, Caché também retrata personagens da classe média em situações de desespero e paranóia, à beira do abismo. Inicialmente temos acesso à rotina frívola de um prestigiado apresentador de televisão ao lado de sua família, que começa a receber telefonemas anônimos e desenhos perturbadores, além de fitas de vídeo cujo conteúdo são fatos corriqueiros de sua vida. Tudo de um caráter doentio. Seu perseguidor, parece acompanhá-lo em cada um dos espaços que ele frequenta. A trivialidade cede lugar a um fato trágico após o confronto com o passado e uma realidade inesperada. O protagonista se sente coagido por ter culpa e por carregá-la durante anos, tentando enterrá-la de alguma forma em seu íntimo. Haneke utiliza o choque e a violência como mecanismos que orientam seus personagens e conduzem sua trama produzindo um impacto gráfico que contrasta com a constante sutileza e elegância de sua câmera. Também explora espaços fechados tirando bom proveito de seus cenários, atentando para a riqueza dos detalhes e transmitindo ao espectador uma sensação inevitável de claustrofobia. Como de praxe, o diretor nos faz voyeurs, espiando a interação entre os personagens de longe, sempre à distância. Em dado momento, nos fazendo sentir intrusos e um tanto constrangidos ao adentrar um universo de segredos tão aterradores. Outro dos achados deste longa, é mostrar diferentes ângulos de uma mesma sequência, não só apresentando uma outra perspectiva da cena, como tornando mais claro o seu objetivo com este filme. O final inconclusivo pode soar frustrante para aqueles que não compreendem aonde Haneke quis chegar. Muito mais do que apontar culpados, o cineasta quis mostrar a consequência da causa, a ação da reação. O que ocorre quando somos confrontados com o passado e o sentimento de culpa. Quais são os nossos limites e como podemos perder o controle sobre nossas próprias atitudes e mesmo sobre nossas próprias vidas. 

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[A vida, o universo e tudo mais] A arte do spoiler

15:03 Andrizy Bento 1 Comments

Hitchcock não via graça ou emoção em whodunit 
Alfred Hitchcock não gostava de whodunit - um recurso narrativo cuja tradução livre para o português pode ser "quem matou?" - consiste em fazer com que o público tente desvendar quem é o assassino da obra, tendo como base pistas espalhadas no decorrer da trama. O mestre do suspense achava que o público se envolvia mais se compactuasse da identidade do assassino. Que o espectador deveria ser onisciente, saber de todos os fatos, estar informado de toda a situação, que nada lhes deveria ser omitido. Segundo o próprio: "whodunit suscita uma curiosidade destituída de emoção; ora, as emoções são um ingrediente necessário ao suspense".

Longe de mim querer discordar de Hitchcock (quem sou eu?), mas creio que ler um livro ou ver um filme não tendo conhecimento da identidade do assassino é uma experiência tão enriquecedora em termos de entretenimento quanto consumir obras de ficção informado sobre a situação em sua totalidade, isto é, sabendo de todos os pormenores da trama, inclusive quem é o assassino.

Os suspeitos de Bryan Singer: Qual deles é Keyser Söze?
Obviamente serão duas experiências diferentes. Tomemos como exemplo o filme Os Suspeitos de Bryan Singer. Na primeira vez em que você o assiste, a revelação de quem é Keyser Söze só chega nos derradeiros momentos. Durante toda a sessão, a preocupação foi tentar desvendar o enigma, atentando para os detalhes. Se for assisti-lo uma segunda vez, de forma alguma seus méritos terão se reduzido. O filme continua ótimo. A diferença é que agora já sabemos quem é  Keyser Söze, então fica mais fácil se concentrar neste personagem, reparar em nuances que tínhamos deixado passar da primeira vez, atentar para sua sagacidade,  nos impressionarmos com sua frieza e calculismo e percebermos o quão bem construído o personagem é.  As coisas farão mais sentido da segunda vez. Isto porque estaremos mais concentrados em estudar o personagem e suas ações, ao invés de procurar pistas que nos levem a descobrir quem é Keyser Söze.

Talvez o exemplo não seja, assim, tão feliz, porque para espectador atento, metade deste filme basta para já se ter uma forte suspeita de quem é Söze. É um filme que funciona melhor da primeira vez por conta do escopo do roteiro e da estrutura narrativa, mas uma segunda, como eu disse, serve para examinarmos melhor o personagem - brilhante, diga-se de passagem - que é o que move a trama.

E eu vou aqui lhes revelar quem é Söze:

Alerta de spoiler! Fechem os olhos, cubram os ouvidos, fujam!
É o Kevin Spacey, pronto! E se você não sabia disso, o que está fazendo da vida que ainda não viu Os Suspeitos? Garanto que é bem melhor do que ler este blog.

Acabei de dar um spoiler...

Bem, spoiler é o assunto de hoje. De acordo com Henry Jenkins, naquele livro maravilhoso Cultura da Convergência (que todos os aficionados em cultura pop DEVERIAM ler):
A palavra spoiling começa lá atrás - ou pelo menos até onde se consegue ir para trás - na história da Internet. O spoiling surgiu do desencontro entre as temporalidades e geografias dos velhos e novos meios de comunicação. Para começar, as pessoas da Costa Leste viam uma série de TV três horas antes das pessoas da Costa Oeste. Algumas séries eram exibidas em noites diferentes, em mercados diferentes. Séries americanas eram exibidas nos EUA seis meses ou mais antes de estrear no mercado internacional . Enquanto as pessoas de diferentes lugares não conversavam entre si, cada uma delas tinha uma experiência em primeira mão. Mas, uma vez que os fãs passaram a se encontrar on-line, essas diferenças de fuso horário se avultaram. Alguém da Costa Leste entrava on-line e postava tudo sobre um episódio. E alguém na Califórnia ficava irritado porque o episódio tinha sido "estragado" ("spoiled"). Então, quem postava uma mensagem começava escrevendo a palavra "spoiler" na linha do assunto, para que as pessoas pudessem decidir se iriam lê-la ou não.
Segundo Amer (deste blog sensacional que todos deveriam conhecer):
A molecada de hoje reclama quando UM PÔSTER revela um personagem novo para a nova temporada de uma série, tudo é spoiler pros badernistas de hoje. Nenhum desses putos ia sobreviver nos anos 1990!
Concordo plenamente. Basta analisarmos os comentários no Orangotag, uma rede social que permite que marquemos os episódios que já assistimos de uma série para termos controle do que vemos e não nos perdermos no meio de tantos seriados que acompanhamos ao mesmo tempo.

Sempre que vou lá, fico impressionada com a falta de conhecimento das pessoas sobre o que é spoiler.

Spoiler caracteriza revelações surpreendentes do enredo, fatos drásticos que podem vir a modificar de maneira significativa o nosso entendimento sobre a narrativa, ou o rumo do episódio ou da trama. Revelar quem é o assassino de um "whodunit" é um spoiler terrível para quem não quer saber deste fato, para quem pretende desvendar sozinho, para quem quer se impactar com a surpresa. Dizer quais personagens morrem e como morrem em episódios futuros é um puta spoiler. Abrir a matraca para contar o rumo infeliz que os personagens vão tomar no decorrer de uma série ou de um livro é um spoiler tremendo.

Batman me representa.
Robin representa os engraçadinhos do facebook
Eu, por exemplo, fugi o máximo que pude das redes sociais no dia da series finale de Breaking Bad ou da regeneração do Eleventh Doctor para o Twelfth em Doctor Who. Isto porque eu, que possuo capacidade mental suficiente para ligar um computador, sei que redes sociais são redutos de spoilers. Especialmente o twitter e o tumblr. Eu havia decidido começar Breaking Bad apenas quando a série chegasse ao fim. Desta forma, escapei de spoilers como Michael Bay escapa do bom senso. Todo mundo sabe que o ambíguo protagonista, Walter White, morre no final de BrBa. Mas "como ele morre" é a grande questão. Eu não queria saber se ele ia morrer pelas mãos da polícia, ou de outros traficantes, ou se ia se suicidar (havia essa possibilidade), ou se morreria em decorrência do câncer. Se alguém ousasse me contar, poderia se declarar uma pessoa tão morta quanto Walter White. Por vezes eu fazia uma publicação a respeito da série no meu facebook, e surgiam sabe Deus de que buraco os inconvenientes comentar coisas como "essa série é foda, mas o melhor é o final quando ele morre, você precisa ver, ele morre depois que..." e eu parava de ler por aí e deletava o comentário.

Eu tenho um login e uma senha. Estou no meu direito de apagar comentários das minhas publicações no facebook.

O que eu gostaria de saber é por que essas pessoas acham que lançar spoiler do final de uma série para quem ainda está na metade, é tão legal? Elas estão bancando as engraçadinhas? (tem um no meu fb que realmente acha que está sendo engraçado e que é a coisa mais legal do mundo ser estraga-prazeres). Tem outra que acha que estará sendo mais inteligente se soltar spoiler nos comentários dos meus posts, que isso faz dela uma pessoa mais culta porque ela soube dos fatos da série antes de mim.

Mas é claro que você sabe, meu amor! Você assistiu a série antes de mim. Não precisa spoilar para provar isso.

Coleção de spoilers!
Eu acho que nos posts dos outros e nos groups do FB, deve-se respeitar o desejo e o pedido de quem não quer spoiler. É uma falta de educação tremenda você soltar uma revelação importante da trama, quando é sabido que a maior parte das pessoas não gosta e não quer. Que acha que isto é tão sem graça quanto revelar um truque de mágica. Perde o encanto, perde a magia. Em um grupo de séries, você deve estar ciente de que a maior parte dos membros não quer saber de revelações chocantes da trama sem antes assistir. Não custa nada avisar com uma tag e recorrer aos pontinhos
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Pronto. Resolvido. Lê quem quer. 

Mas é muito chato quando você está no meio de uma discussão sobre a série, comentando um episódio, e vem alguém e diz o que vai acontecer nos próximos quando você não perguntou nada. 

Não importa se a série é derivada de livros ou HQ's. Eu não sou obrigada a correr atrás dos materiais originais antes de ver as séries. De Game of Thrones, eu procuro spoilers. Não li os livros, ainda pretendo, mas sempre recorro a fóruns ou amigos que leram para saber qual é o destino dos personagens na obra literária, de forma que eu não sofra muito quando eles morrerem, já que costumo me apegar demais. Mas de The Walking Dead, eu não quero saber. Eu gosto da surpresa. Eu gosto da tensão de não saber quem é a próxima vítima.

Poderia ser tanto um spoiler de Game of Thrones quanto
de The Walking Dead 
Respeito no mural dos outros. Respeito nos groups.

É diferente, por exemplo, de quando as pessoas postam spoilers em seus respectivos twitters e murais do facebook. Aí não tem como reclamar. Ninguém tem controle sobre o que os outros postam em suas redes e eles podem fazer o que bem entenderem. O máximo que se pode fazer para fugir disso é dar unfollow.

Eu já fiz publicações engraçadinhas no facebook dizendo, por exemplo, que estava passando na Sessão da Tarde um determinado filme, cujo(a) protagonista morre no final. Mas estamos falando de filmes que todo mundo assistiu ou, se não, já conhece a história de trás para frente de tanto ouvir os outros falarem. Spoilers inofensivos.

E, sendo bem radical, acho que quem não quer correr o risco iminente de ler spoilers, não deveria ter tumblr e nem twitter. Ou pelo menos, aprender a utilizar recursos de filtragem para evitar esses inconvenientes. Afinal, não existe lei que proíba as pessoas de postarem spoilers. E não há maneira de você mandar mention para cada um dos usuários de rede sociais, pedindo encarecidamente que não soltem spoiler na timeline. É impossível.

Precisando urgentemente que alguém solte um spoiler
desses da minha vida
Fui alvo de indiretas por conta deste assunto duas vezes pela mesma pessoa no twitter. Da primeira vez, eu estava conversando com uma amiga acerca de uma série. E óbvio que não tinha como não dar spoilers no meio deste colóquio. Mas estávamos falando entre nós, por mention, no NOSSO twitter. Veio um ser que sofre de síndrome de velha ranzinza aguda precoce (visto que ela nem chegou aos 40 ainda), nos criticar por meio de indiretas dizendo que não adiantava ela assistir à série se já tinha spoiler de graça no twitter. Que tal se você parasse de dar atenção às conversas dos outros, querida? Se bem me lembro essa era a mesma que dizia que não lia a timeline porque achava desagradável pessoas que "conversavam" por mention como se twitter fosse msn. O dia da crítica foi, então, uma exceção à regra?

Noutra ocasião, eu sequer sabia que a criatura estava on e comentei um spoiler revoltante no MEU twitter. Isto porque quase ninguém via a série, a maioria não se interessava muito. E todos os que eu conhecia que a acompanhavam, já haviam assistido ao episódio. 

Veio a velha ranzinza com rompantes adolescentes me ameaçar por indiretas novamente. A pessoa estava quieta, sem usar o twitter há dias. COMO EU PODERIA ADIVINHAR QUE ELA ESTAVA ON NO PRECISO MOMENTO EM QUE EU DEI UM SPOILER DE UMA SÉRIE QUE QUASE NINGUÉM ASSISTIA OU SE IMPORTAVA?

Né, Cersei?
Tem sempre esses fulaninhos no twitter, os típicos que acham que todos devem pedir "permissão" a eles antes de tweetar qualquer coisa. Sim, eu acho que devemos ter bom senso. Não sou a favor dessa história de "o twitter/facebook é meu, eu posto o que quiser", pois isso vira justificativa para baderna, para gente sem educação fazer comentários desrespeitosos, ofensivos e preconceituosos sem nenhuma consciência de que está agindo errado. Pior, acham que estão certos porque "é MEU espaço, eu falo o que eu quiser". Não é bem assim. Você posta o que quiser, mas respeite o espaço dos outros. Qualquer dia desses eu falo melhor sobre isto, até porque pretendo escrever um texto sobre o comportamento de usuários de redes sociais. Mas, de fato, é por isso que o twitter vem decaindo. A gente segue as pessoas por respeito, mas não tem nenhum interesse no que elas tweetam. Não é como o facebook, que você pode simplesmente tirar as pessoas do seu feed sem precisar exclui-las de sua lista de amigos. E, sinceramente, porque a gente usa twitter mesmo? Pra ficar falando que vai tomar banho, jantar, trocar de roupa, ver um filme, enfim... dar spoilers desinteressantes de nossas vidas desinteressantes...

A questão é, não quer ler spoiler? Então não tenha twitter. Ou tenha, mas use o global filter. Melhor invenção da história das redes sociais. E o melhor conselho que eu posso dar para os anti-spoilers: NÃO TENHAM TUMBLR! 

Nunca vou entender quem odeia spoiler e tem tumblr. Sinceramente!

É como se eu, hater assumida do Ashton Kutcher, começasse a comprar os DVDs dos filmes dele. Não tem cabimento. 

Mas o tumblr também conta com recursos de filtragem, então não reclamem!

Eu falei do orangotag mais acima, e como é incrível que lá tudo é spoiler. Se alguém aparece comentando que no começo de um episódio de uma determinada série, o personagem X deu "oi" pra personagem Y, já vem a galera marcar o comentário como spoiler, dar lição de moral e iniciar a Terceira Guerra Mundial.

Pode ser um spoiler. Mas também pode ser só alguém dizendo que o Tyrion
espirrou nesse episódio de Game of Thrones
Vamos deixar uma coisa bem clara: você não querer saber NADA a respeito de um episódio, nem quem deu "boa tarde" para quem, não classifica automaticamente os fatos triviais da trama como spoilers, ainda mais quando estão sendo comentados em uma rede social na qual um dos objetivos é justamente conversar sobre séries. E se você não quer saber NADA sobre o episódio, ASSISTA antes de entrar no site. Quem está sendo tolo (olha que estou procurando ser gentil) é você mesmo que sabe que pode se deparar com um spoiler (ou mesmo com um fato trivial que você não quer saber) sendo comentado ou debatido, e comete a bobagem de ler a discussão de outros espectadores por lá.

De novo: spoiler designa revelações impactantes sobre o enredo. Fatos que podem alterar todo o curso da trama. Coisas chocantes cujo objetivo é exatamente o espectador assistir para descobrir.

Um personagem dar "bom dia" para outro, ou almoçar com ele, ou tropeçar na rua, ou aparecer com roupa amarela, ou com tênis Nike, ou acessar o google durante a trama NÃO é spoiler.

Como uma imagem diz mais do que mil palavras, eu aderi ao conceito de que um gif deve valer mais do que mil imagens. Portanto, darei exemplos em gifs do que é spoiler e o que não é, uma vez que somos parte de uma cultura extremamente visual, cujo grafismo torna tudo mais fácil de assimilar, vamos lá:

Isso é spoiler:



Isso não é:



Entendidos?

*Salut!*

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